quinta-feira, 27 de março de 2014

A particularidade cultural


Angola é um país pluriétnico e multicultural ("uma Nação de várias nações", como a definiu o poeta Agostinho Neto, primeiro presidente da República independente), cuja identidade se foi forjando ao longo de séculos de uma história conflituosa, feita de trocas socioeconómicas, biológicas, culturais e linguísticas entre intervenientes de muitas origens, alguns deles provindos de fora do continente.

Tudo isto conformou uma sociedade “sui generis”, mesmo no contexto dos outros países africanos colonizados por Portugal, em que coexistem povos de diferentes características e em diferente nível de desenvolvimento, mais abertos uns, sobretudo os de cultura urbana, a todas as inovações e influências vindas do exterior (aí incluída a língua portuguesa) e outros, mais confinados ao mundo rural, conservando praticamente intactas as suas tradições e formas de vida, com línguas próprias (ainda que de comum raiz bantu) e com comportamentos e práticas sociais perfeitamente diferenciáveis no quadro nacional.

É assim inevitável que as manifestações expressivas de uns e de outros se situem muitas vezes em extremos quase opostos, errando apenas quem pretenda estabelecer entre elas hierarquizações ou quaisquer outras escalas valorativas, em vez de reconhecer que nessa diversidade está a verdadeira riqueza cultural do país.

A longa guerra de libertação nacional (1961-1974) e as guerras que se seguiram à Independência do país, apesar dos dramas e do cortejo de horrores que lhes estão associados, tiveram pelo menos o mérito de concluir a já avançada destribalização do pais, fazendo circular (forçosamente, nalguns casos) povos de todas as etnias e regiões pelo país inteiro e acelerando a sua integração num todo nacional reconhecível nos seus principais símbolos - a bandeira, o hino, a unidade monetária comum - e até mesmo na língua oficial portuguesa.
Hoje já ninguém questiona a existência da "angolanidade", que mais não é do que a consciência de pertença a um todo nacional, seja numa base histórico-cultural, simbólica ou simplesmente afectiva, que implica não só o respeito pelo património comum e pelos valores, crenças e princípios da maioria dos cidadãos, mas também o respeito pela identidade e a valorização de todos os grupos parcelares que compõem a Nação angolana e suas respectivas culturas.

Uma fase importante dessa valorização consistiu, por exemplo, na fixação do alfabeto e na descrição fonética, fonóloga, morfossintática e semântica das seis principais línguas africanas de Angola - o kikongo (falado a Norte), o kimbundo (falado numa região que vai de Luanda para o interior, até Malanje), o tchokwe (falado a Leste), o umbundo (no Centro/Sul), o mbunda e o kwanyama (a Sul).

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